Como lidar com pessoas com deficiência visual

Eu costumo contar bastante a minha história. Conto a história de que não fui sempre cego. Conto a história de como perdi a minha visão enquanto servia no Afeganistão. Conto a história de como coloquei minha própria lesão em perspectiva considerando o grande sacrifício dos meus companheiros que perderam a vida e como os honro fazendo o meu melhor por ter sobrevivido.

Conto a história de como fiz para ganhar uma medalha de ouro na natação nas Paralímpiadas um ano depois que perdi a minha visão. E depois que conto isso, as pessoas geralmente me agradecem. Eles dizem que é uma história incrível e que sou um bom contador de histórias. Eles dizem que é inspirador ver como superei a minha cegueira.

Mas essa não é a história toda.

É apenas uma parte, eu acho – de muitas formas, eu superei a minha cegueira. Cinco anos após perder a minha visão, consegui um emprego como professor na Academia Naval. Minha qualidade de vida é muito boa. Dia após dia, semana após semana, passo a não achar que a minha cegueira é um obstáculo.

O que eu não consegui superar é como os outros me percebem e me tratam diferentemente por causa da minha cegueira ou como normalmente me sinto deslocado escutando a vida de outras pessoas.

Escuto pessoas falando sobre o lindo nascer do sol, mas não posso mais vê-lo. Escuto pessoas falando sobre ” Game of Thrones”, mas não posso mais assisti-lo, pois a HBO não fornece audiodescrição. Não posso mais compartilhar essas pequenas experiências.

Uma coisa que faço bastante agora é dar palestras sobre como aprendi a administrar a minha vida sem enxergar. Contudo, essa é uma conversa unilateral. Em seguida, vou para o aeroporto onde relembro o quão difícil é viver em um mundo que não é adaptado para pessoas que não enxergam. É sempre um drama conseguir assistência no balcão de atendimento. É um drama passar pela inspeção de segurança que não consegue distinguir comida de cachorro e explosivos. É um drama conseguir lugar para o meu cão-guia no avião. Isso sem contar com o drama para conseguir um banheiro para nós dois.

Sinto os olhares dos outros passageiros imaginando qual é a minha história, mas nunca me perguntam por receio de me ofender.

Na minha antiga vida como um oficial especialista em explosivos, viajei por aeroportos de todo o mundo, de Baltimore para Praga, de Bangladesh para Kandahar, de forma rápida, fácil e anônima. Mas viajar agora na minha situação, com uma bengala e um cão-guia, é tudo menos anônimo. Às vezes, fico devastado.

Em casa, minha falta de habilidade para participar das conversas dos meus amigos sobre “Games of Thrones” ou memes no Instagram me colocam para baixo. Recuso convites para evitar a sensação de estar alienado. Mesmo estando em um bar lotado, restaurante ou concerto, serei um espetáculo, isolado pela minha falta de habilidade em participar das conversas dos que me cercam.

Não obrigado… ficarei em casa, em silêncio, pois sei exatamente aonde estão os banheiros. Ficarei lá até ter que contar novamente a história sobre como superei a cegueira.  A ironia me faz rir.

Há alguns anos atrás, depois de mais uma viagem frustante no aeroporto, sentei em meu assento para Dallas e fiz o meu melhor para desaparecer. Até que a moça que estava sentada ao meu lado disse ” Que lindo relógio você tem! Nunca vi nada igual!”. Um sorriso se espalhou pelo meu rosto. Adoro falar sobre o meu relógio. É uma peça tátil que substitui o relógio tradicional; assim eu mesmo posso ver as horas.

A conversa com a minha vizinha fluiu e eu expliquei como perdi a minha visão. Falei sobre como tive que me adaptar, como tento manter a perspectiva e como me sinto por ter superado a minha cegueira. Então, ela começou a falar de suas próprias lutas. Ela havia perdido o marido há alguns anos e durante o luto ganhou muito peso. Ela contou que tem lutado contra o peso desde então, e isso começou a interferir em sua qualidade de vida. Falei para ela sobre como me sinto isolado por causa da minha deficiência e ela diz que sente a mesma coisa por conta do seu peso. Compartilhei como às vezes me sinto um estranho, e ela disse que também se sente assim.

Pela primeira vez em muito tempo, não me senti como um espetáculo. Senti como se fosse um amigo; senti que tinha valor, que era importante e tudo o que tivemos foi uma simples conversa.

Por vezes me perguntam sobre o que quero que as pessoas saibam sobre a cegueira. Quero que os outros se sintam mais confortáveis em conversar com pessoas cujas experiências são diferentes das delas. Meu relógio é um gatilho natural e assim que a conversa se inicia, normalmente falamos sobre tópicos que ultrapassam relógios ou deficiências. Através da conversa, encontramos humanidade.

Sei que é muito difícil para algumas pessoas conversar com outros que sejam tão diferentes delas mesmas… por se sentirem desconfortáveis ou ofendidas, por não encontrarem algo em comum, por terem que escutar os problemas dos outros e compartilhar os seus próprios. Mas você pode se surpreender com o que poderá tirar dessa experiência – e o que poderá dar em retorno.

E como fazemos isso? Tudo começa com uma conversa.

Qual é a sua história?


Texto adaptado de ” How to Really See a Blind Person” de Brad Snyder


 

8 comentários sobre “Como lidar com pessoas com deficiência visual

  1. miriamcarmignan disse:

    Olá Talita! Adorei ler esse texto. Vamos compartilhar essas belas histórias de superação…Independente das aflições das pessoas, sejam quais forem… Que o sol aqueça todos os corações que buscam um pouquinho da nossa compreensão… Grande abraço, Miriam, Blog Buscando o Sol

    Curtido por 1 pessoa

  2. marzia disse:

    Olá, eu recebi ajuda do tradutor do Google porque eu não falo Português..
    Já participei de pessoas cegas e com deficiências visuais no passado e tive muitos problemas porque eles fingiram aceitar, mas na realidade eles não eram, eu não queria fazer algo por eles, mas alguém que se sentiu ofendido não foi uma boa experiência..
    ..há muitas cidades que eu não sei onde eu gosto de um físico mas mental Um abraço

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  3. Coach Giardino disse:

    Talita! Boa tarde,

    Que maravilhoso texto! Estive pensando! Quantas pessoas querem apenas conversar? Talvez muitas. Apenas, encontrar alguém que ao menos a ouça. E desse ouvir surgir uma conversa, um diálogo, ou mesmo um prosa. Isso é humanidade. Nos tornamos humanos ao permitir que nossa sensibilidade aflore, ao ouvir outro ser humano. Não é que não sejamos humanos, ao menos aflora um das nossas melhores qualidades como humano.

    Obrigado por compartilhar este riquíssimo texto.

    Ricardo Giardino

    Curtido por 1 pessoa

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